As viagens imaginárias me levam ao lugar que eu quero. Penso, sigo, levito sobre caminhos por mim aquarelados. Outro dia, uma amiga disse que o sonho dever ser grandioso, imenso, maior do que a nossa imaginação. Não consigo devanear para além do que imagino. O ponto limite é o voo da inventividade. Alcanço um limiar que se insere nos laços das circunstâncias, ainda que tudo esteja dentro de mim. Não fora. Acomodo os anseios nas gavetas perras e trancadas do inconsciente, quase sempre escondidas nos espaços abandonados, de modo a evitar contatos freqüentes. Às vezes, o pequeno se transforma numa amplitude sem tamanho. Gosto do simples e das coisas miúdas. Quando vejo uma rosa maravilho-me com suas pétalas aveludadas, vermelhas, cor de chá; pouco importa, o que vale é cada retalho que enxergo. Meus olhos veem o que pressinto. Assim não disponho de barreiras à minha frente.
E, no entanto, o tangível não representa a minha força interior. Toco no que sinto, o apenas palpável serve de linha de partida para as fantasias. Daí voar pelo mundo afora. Vou. Estou sempre indo como uma andorinha que procura a primavera, depois o verão, e retorna, a depender do ritmo das estações. Retenho nos olhos e na mente a capacidade de alumiar dias e noites. Por incrível que pareça, as noites clareiam os meus olhos, vejo melhor sob a penumbra, os castiçais acesos me bastam. A chama das velas oferece a luz de que necessito. Fachos histriônicos me encandeiam. As sombras permitem uma multiplicidade de visões, algumas indefinidas, outras definidas, todas permeadas por suaves intersecções. E entre imagens aladas transito no universo sensorial. Cabe-me velar pelos sentimentos, então, alimento a fonte dos desejos. E são tantos!
Vivo em alerta na tentativa de apreender o que há de menor no entorno. Amo os detalhes: mesa posta, talheres enfileirados, copos a cintilar, a pequena gota d’agua que desce no cristal transparente, quase minúscula; o seu movimento é mínimo, mas eu enxergo a lentidão de um pingo vazando pelo vidro exterior. Assisto à leveza do que parece invisível. Não ouso mexer em nada, vejo apenas. E vejo um copo sem cor, igual a todas as imagens límpidas, puras, claras.
Ao centro da mesa outros pingos repousam sobre as frutas que adornam a bandeja de prata. Exalam um intenso frescor. O círculo sem diâmetro mensurável fragmenta-se na superfície espessa da laranja, da goiaba, da maçã, da pêra... Ah!, como as coisas miúdas me agradam!...
Agigantam-me pela fragilidade. Nem conheço a minha altura quando percebo o pequeno. Assim, permito que a imaginação me torne fortaleza inabalável. Em átimos de segundo, o relógio gira e gira e gira... O tempo, esse desconhecido, vai se acumulando na sequência das frações mínimas. Se o tempo existe por sobre ínfimas camadas que não assimilo, o que dizer do meu pensar fluido, veloz, dinâmico e etéreo? Diáfano, sem medidas, porque apto a absorver tudo que me rodeia. Sobretudo os volteios diminutos.
A gota d’água continua migrando sem saber para onde. Quantas semelhanças se somam entre a gota d’água e eu? Não sei responder. As perguntas são sempre difíceis, reclamam prodigiosa intuição. E ao formulá-las, acabo me perdendo no que pretendia expressar. Mas a imaginação não rouba de ninguém o prazer de se fazer matéria concreta. Quantas vezes a criatividade se metamorfoseia no real! É uma questão apenas de exercício de abstração.
Das coisas miúdas extraio a substância da vida. Elas me conduzem ao sonho e a tudo que idealizo. Em algum momento assinalarei os pequenos nadas do cotidiano. Pegarei o lápis, o papel e começarei a definir pausadamente a relação, captando o que em volta de mim se delineia. Sem hierarquia. À vontade. Como se a duração do sonho começasse pela gota d’água ou por mim mesma, que sou tão pequena, equivalente às coisas miúdas que ninguém percebe; porém, dotada de uma enorme imaginação. O que mais posso almejar?
E penso e sonho e caminho e deslindo a gota d’água e não sei para onde vou, sequer sei o que sou.
O QUE VOCê é? me responda sem demora?.....
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